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sexta-feira, março 05, 2010

O mal–estar na civilização

FREUD, Sigmund. O mal-estar da civilização. Rio de Janeiro: Imago, 1997

Neste texto Freud começa por tratar de uma questão posta por um amigo que é a do “sentimento oceânico”, uma sensação de eternidade, de algo ilimitado e sem fronteiras. Ele passa a discutir a validade do sentimento religioso (p. 131).
“Não é fácil lidar cientificamente com sentimentos” (p. 132).
Freud diz que com esse sentimento denominado “oceânico” se quer falar sobre o sentimento de um vínculo indissolúvel, de unidade com o mundo externo, mas não acha que se trate de um sentimento de natureza primária, um sentimento imediato.
Existe uma coisa de que podemos estar certos, segundo Freud, é o de nosso eu, nosso ego (p.132). Exteriormente, o ego parece ser claramente delimitado, mas no enamoramento e em alguns estados patológicos a fronteira entre o ego e o mundo externo se torna incerta. Desse modo, o sentimento de nosso próprio ego pode sofrer distúrbios e suas fronteiras não são permanentes.
Ele levanta a hipótese de que o ego adulto passa por um processo de desenvolvimento. Uma criança vai reagindo a estímulos e, paulatinamente, diferenciando o mundo externo como fonte de suas sensações. Vai diferenciando e identificando as sensações de seus próprios órgãos corporais e de outras que lhe fogem ao controle só reaparecendo de tempos em tempos, como o seio da mãe. Desse modo, o ego é contrastado por um “objeto” – algo que existe no exterior que só aparece ocasionalmente (p.133). “Outro incentivo para o desengajamento do ego com relação à massa geral de sensações – isto é, para o reconhecimento de um ‘exterior’, de um mundo externo – é proporcionado pelas freqüentes, múltiplas e inevitáveis sensações de sofrimento e desprazer, cujo afastamento e cuja fuga são impossíveis pelo princípio do prazer, no exercício de seu irrestrito domínio. Surge, então, uma tendência a isolar do ego tudo que pode tornar–se fonte de tal desprazer, a lança–lo para fora e a criar um puro ego em busca de prazer, que sofre o confronto de um ‘exterior’ estranho e ameaçador. As fronteiras desse primitivo ego em busca de prazer não podem fugir a uma retificação através da experiência”. Aos poucos a criança passa a diferenciar, através de uma direção deliberada das próprias atividades sensoriais e de um movimento muscular apropriado, o que é interno (ego) e externo (objeto) e assim se introduz o “princípio de realidade” que norteia o desenvolvimento posterior.
Esse é o processo, descrito por Freud, de separação do ego do mundo externo. Inicialmente o ego inclui tudo e depois se separa do mundo exterior. Ele supõe que, em algumas pessoas, esse sentimento primário do ego persistiu em algum grau e continua nelas ao lado do ego demarcado da maturidade, tendo como conteúdo ideacional a ilimitabilidade e o vínculo com o universo (p.134).
Freud levanta a questão sobre o que do passado se preserva na mente humana. “A suposição de que tudo o que passou é preservado se aplica, mesmo na vida mental, só com a condição de que o órgão da mente tenha permanecido intacto e que seus tecidos não tenham sido danificados por trauma ou inflamação” (p.136). […] Ele afirma que talvez se possa afirmar que “o que se passou na vida mental pode ser preservado, não sendo, necessariamente, destruído”. Assim, ele levanta a hipótese de que o “sentimento oceânico” experimentado por muitas pessoas, tem sua origem talvez em uma fase primitiva do sentimento do ego”.
Ele explica, a partir daí, que as necessidades religiosas talvez se devam ao desamparo do bebê e do anseio pelo pai que tal necessidade desperta e que se mantém além da infância devido ao medo do poder superior do Destino (p.137).

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